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segunda-feira, 23 de setembro de 2019

O julgar na visão cristã


O julgar na visão cristã
Por Sérgio Diniz


Se no passado, em nossas juventudes éramos “esmagados” sob o peso de uma igreja “pesada”, onde tudo era pecado e tudo se julgava, onde pecávamos o tempo todo por querer julgar tudo e todos, me parece que nos tempos atuais estamos caminhando em sentido completamente oposto: estamos perdendo a noção do certo e do errado à luz dos ensinamentos do Cristo: tudo parece válido, ficamos com a sensação de termos as mãos atadas, temos vergonha de nos posicionarmos.
Agora,  nos parece que qualquer falta, ou atentado contra a Palavra, é deixada de lado, não são apontados erros graves, por medo de julgarmos e assim, ainda que involuntariamente, cometemos novo pecado. O maldito do “Politicamente Correto”. Tornou-se lugar comum a frase “não podemos julgar...” ou “quem sou eu para julgar”. Essas frases, em si, são perfeitas, provém do Evangelho, mas nos parece que estão sendo muito mal usadas atualmente, servindo como um opiáceo às diversas novas pressões e desafios complexos que a sociedade moderna nos impõe diariamente. Então, caímos em um outro pecado: o pecado de não nos posicionarmos contra as mazelas do mundo atual, pois muitas vezes não sabemos como agir, então preferimos o “não agir”, o “não julgar” e também muitas vezes o “ não ver”. Lavamos nossas mãos, como Pilatos modernos.
É certo que ao julgar nossos irmãos, estamos de fato cometendo pecado contra eles: “Não julgueis, e não sereis julgados. (São Mateus 7, 1)", "Não julgueis, e não sereis julgados; não condeneis, e não sereis condenados; perdoai, e sereis perdoados; (São Lucas 6, 37)", ou ainda, "Deixemos, pois, de nos julgar uns aos outros; antes, cuidai em não pôr um tropeço diante do vosso irmão ou dar-lhe ocasião de queda. (Romanos 14, 13)".
Mas, qual é o erro em julgar o irmão? Como nos explica São João, "Não julgueis pela aparência, mas julgai conforme a justiça”. (São João 7, 24)", ou seja, o erro nos parece estar muito mais em julgar sem maiores análises, o julgamento precipitado, a sentença definitiva, “carimbar” a pessoa pelo que aparenta, sem conhece-la. "Vós julgais segundo a aparência; eu não julgo ninguém. (São João 8, 15)" e ainda, segundo Paulo, "Julgais as coisas pela aparência!... Quem se gloria de pertencer a Cristo considere que, como ele é de Cristo, assim também nós o somos. (2 Coríntios 10, 7)”. Isso, de fato, é pecado, o julgar pela aparência. Por outro lado, São João nos alerta novamente para julgar, sim, mas conforme a justiça, a justiça de Deus, que é a sua Palavra.
O julgamento, pela justiça, nos é cobrado por Cristo: "Por que também não julgais por vós mesmos o que é justo? (São Lucas 12, 57)", temos que saber julgar sim, ao invés do “não julgar”, do lavar as mãos. Paulo nos alerta: "Irmãos, não sejais crianças quanto ao modo de julgar: na malícia, sim, sede crianças; mas quanto ao julgamento, sede homens. (I Coríntios 14, 20)". Se um irmão peca, devemos agir, sim, para não sermos cúmplices em seu pecado: “Se teu irmão tiver pecado contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele somente; se te ouvir, terás ganho teu irmão. (São Mateus 18, 15)". É nossa obrigação cristã zelarmos pela integridade de nossos irmãos: não podemos vê-los pecando e simplesmente dizermos “não devo julgar”, o problema é dele, dele com Deus.
A frase "Deus ama os pecadores, mas odeia o pecado" não está na Bíblia. É fruto de uma reflexão teológica que deriva das atitudes de Cristo. A máxima expressão deste comportamento de Jesus é encontrada na sua paixão, quando Ele morre pelos injustos (veja 1Pedro 3,18).1 No entanto, essa reflexão também serve para nós. Não julguemos os irmãos pela aparência, pois não sabemos suas reais intenções, pois só Deus penetra no coração das pessoas. Mas devemos sim, julgar as atitudes, os pecados contra a os mandamentos de Deus, contra a Palavra. Mas para isso, temos que aprender de fato a julgar, segundo a vontade de Deus e não através de nossa visão, míope.
" 10.Então, ele se ergueu e vendo ali apenas a mulher, perguntou-lhe: “Mulher, onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou?”. 11.Respondeu ela: “Ninguém, Senhor”. Disse-lhe então Jesus: “Nem eu te condeno. Vai e não tornes a pecar”." (São João, 8). Vejamos aí: Cristo não a condenou, mas a admoestou, “não tornes a pecar”. Cabe a nós seguir seu exemplo: sem julgar os irmãos, devemos, sim, alertá-los sobre seus pecados; mas para isso, temos que mudar antes o nosso olhar, usar o olhar de Deus e não o olhar humano.
Nesse sentido, convém lembrar a metodologia que nos foi ensinada (ou deveria ter sido!) pela própria Igreja, o método do ver-julgar-agir, como parte do ensino e prática sociais católicos. O Papa João XXII reconheceu formalmente o método ver-julgar-agir em sua encíclica Mater et Magistra publicada no dia 15 de maio de 1961. O método foi desenvolvido pelo falecido cardeal Joseph Cardijn, fundador do movimento da Juventude Operária Cristã - JOC, que sugeriu ao Papa João que publicasse uma encíclica para marcar o 70º aniversário da histórica encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII. Em resposta, o Papa João pediu que Cardijn providenciasse um esboço das questões a serem abordadas na encíclica. Ele fez isso em um memorando de 20 páginas apresentado ao pontífice.2 Essa metodologia3 nos ensina como ver a complexidade em que nos encontramos, mas não de uma forma passiva, com a realidade simplesmente passando diante de nossos olhos, mas vendo pelos olhos do Cristo. Assim, podemos e devemos sim julgar, mas não diante de critérios humanos, e sim à luz da Fé de da Palavra de Deus. Após isso, temos a obrigação cristã de agirmos, não de acordo com nossas vaidades e desejos mesquinhos, mas transformando a realidade ao nosso redor, começando por nós mesmo e, depois de tirada “a trave” de nossos olhos, transformando a sociedade ao nosso redor.
Hoje, temos muitos desafios em nossa fé católica, muitas agressões no mundo contra a vida (ex. aborto) e contra a família (ex. ideologia de gênero), entre outras. Jesus disse a respeito de seus discípulos em resposta aos fariseus: "“Digo-vos: se estes se calarem, clamarão as pedras!”. (São Lucas 19, 40)". Portanto, se somos verdadeiros discípulos, devemos nos calar?

Bibliografia:

Agradecimentos.
Ao Padre José Alem, pela inspiração e colaboração, e por manter sempre acesa a chama da verdade em nossas almas.