O
julgar na visão cristã
Por
Sérgio Diniz
Se no passado, em nossas
juventudes éramos “esmagados” sob o peso de uma igreja “pesada”, onde tudo era
pecado e tudo se julgava, onde pecávamos o tempo todo por querer julgar tudo e
todos, me parece que nos tempos atuais estamos caminhando em sentido
completamente oposto: estamos perdendo a noção do certo e do errado à luz dos
ensinamentos do Cristo: tudo parece válido, ficamos com a sensação de termos as
mãos atadas, temos vergonha de nos posicionarmos.
Agora, nos parece que qualquer falta, ou atentado
contra a Palavra, é deixada de lado, não são apontados erros graves, por medo
de julgarmos e assim, ainda que involuntariamente, cometemos novo pecado. O
maldito do “Politicamente Correto”. Tornou-se lugar comum a frase “não
podemos julgar...” ou “quem sou eu para julgar”. Essas frases, em
si, são perfeitas, provém do Evangelho, mas nos parece que estão sendo muito
mal usadas atualmente, servindo como um opiáceo às diversas novas pressões e
desafios complexos que a sociedade moderna nos impõe diariamente. Então, caímos
em um outro pecado: o pecado de não nos posicionarmos contra as mazelas do
mundo atual, pois muitas vezes não sabemos como agir, então preferimos o “não
agir”, o “não julgar” e também muitas vezes o “ não ver”. Lavamos nossas mãos,
como Pilatos modernos.
É certo que ao julgar nossos
irmãos, estamos de fato cometendo pecado contra eles: “Não julgueis, e não
sereis julgados. (São Mateus 7, 1)", "Não julgueis, e não
sereis julgados; não condeneis, e não sereis condenados; perdoai, e sereis
perdoados; (São Lucas 6, 37)", ou ainda, "Deixemos, pois, de
nos julgar uns aos outros; antes, cuidai em não pôr um tropeço diante do vosso
irmão ou dar-lhe ocasião de queda. (Romanos 14, 13)".
Mas, qual é o erro em julgar
o irmão? Como nos explica São João, "Não julgueis pela aparência, mas
julgai conforme a justiça”. (São João 7, 24)", ou seja, o erro nos
parece estar muito mais em julgar sem maiores análises, o julgamento
precipitado, a sentença definitiva, “carimbar” a pessoa pelo que aparenta, sem
conhece-la. "Vós julgais segundo a aparência; eu não julgo ninguém.
(São João 8, 15)" e ainda, segundo Paulo, "Julgais as coisas pela
aparência!... Quem se gloria de pertencer a Cristo considere que, como ele é de
Cristo, assim também nós o somos. (2 Coríntios 10, 7)”. Isso, de fato, é
pecado, o julgar pela aparência. Por outro lado, São João nos alerta novamente
para julgar, sim, mas conforme a justiça, a justiça de Deus, que é a sua
Palavra.
O julgamento, pela justiça,
nos é cobrado por Cristo: "Por que também não julgais por vós mesmos o
que é justo? (São Lucas 12, 57)", temos que saber julgar sim, ao invés
do “não julgar”, do lavar as mãos. Paulo nos alerta: "Irmãos, não
sejais crianças quanto ao modo de julgar: na malícia, sim, sede crianças; mas
quanto ao julgamento, sede homens. (I Coríntios 14, 20)". Se um irmão peca,
devemos agir, sim, para não sermos cúmplices em seu pecado: “Se teu irmão
tiver pecado contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele somente; se te ouvir,
terás ganho teu irmão. (São Mateus 18, 15)". É nossa obrigação cristã
zelarmos pela integridade de nossos irmãos: não podemos vê-los pecando e
simplesmente dizermos “não devo julgar”, o problema é dele, dele com Deus.
A frase "Deus ama os
pecadores, mas odeia o pecado" não está na Bíblia. É fruto de uma
reflexão teológica que deriva das atitudes de Cristo. A máxima expressão deste
comportamento de Jesus é encontrada na sua paixão, quando Ele morre pelos
injustos (veja 1Pedro 3,18).1 No entanto, essa reflexão também serve
para nós. Não julguemos os irmãos pela aparência, pois não sabemos suas reais
intenções, pois só Deus penetra no coração das pessoas. Mas devemos sim, julgar
as atitudes, os pecados contra a os mandamentos de Deus, contra a Palavra. Mas
para isso, temos que aprender de fato a julgar, segundo a vontade de Deus e não
através de nossa visão, míope.
" 10.Então, ele se
ergueu e vendo ali apenas a mulher, perguntou-lhe: “Mulher, onde estão os
que te acusavam? Ninguém te condenou?”. 11.Respondeu ela: “Ninguém,
Senhor”. Disse-lhe então Jesus: “Nem eu te condeno. Vai e não tornes a
pecar”." (São João, 8). Vejamos aí: Cristo não a condenou, mas a
admoestou, “não tornes a pecar”. Cabe a nós seguir seu exemplo: sem
julgar os irmãos, devemos, sim, alertá-los sobre seus pecados; mas para isso,
temos que mudar antes o nosso olhar, usar o olhar de Deus e não o olhar humano.
Nesse sentido, convém
lembrar a metodologia que nos foi ensinada (ou deveria ter sido!) pela própria
Igreja, o método do ver-julgar-agir, como parte do ensino e prática sociais
católicos. O Papa João XXII reconheceu formalmente o método ver-julgar-agir em
sua encíclica Mater et Magistra publicada no dia 15 de maio de 1961. O
método foi desenvolvido pelo falecido cardeal Joseph Cardijn, fundador do
movimento da Juventude Operária Cristã - JOC, que sugeriu ao Papa João que
publicasse uma encíclica para marcar o 70º aniversário da histórica encíclica Rerum
Novarum do Papa Leão XIII. Em resposta, o Papa João pediu que Cardijn
providenciasse um esboço das questões a serem abordadas na encíclica. Ele fez
isso em um memorando de 20 páginas apresentado ao pontífice.2 Essa
metodologia3 nos ensina como ver a complexidade em que nos
encontramos, mas não de uma forma passiva, com a realidade simplesmente
passando diante de nossos olhos, mas vendo pelos olhos do Cristo. Assim,
podemos e devemos sim julgar, mas não diante de critérios humanos, e sim à luz
da Fé de da Palavra de Deus. Após isso, temos a obrigação cristã de agirmos,
não de acordo com nossas vaidades e desejos mesquinhos, mas transformando a
realidade ao nosso redor, começando por nós mesmo e, depois de tirada “a trave”
de nossos olhos, transformando a sociedade ao nosso redor.
Hoje, temos muitos desafios
em nossa fé católica, muitas agressões no mundo contra a vida (ex. aborto) e
contra a família (ex. ideologia de gênero), entre outras. Jesus disse a
respeito de seus discípulos em resposta aos fariseus: "“Digo-vos: se
estes se calarem, clamarão as pedras!”. (São Lucas 19, 40)". Portanto,
se somos verdadeiros discípulos, devemos nos calar?
Bibliografia:
2Fonte: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/43540-o-cardeal-que-ensinou-a-igreja-a-ver-julgar-e-agir
Agradecimentos.
Ao Padre José Alem, pela inspiração e colaboração, e por
manter sempre acesa a chama da verdade em nossas almas.
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